No dia 31/10/2017, pescadores e pescadoras artesanais, quilombolas e posseiros nativos da região do Cabo de Santo Agostinho e de Ipojuca realizaram um importante ato contra novas obras de dragagens que o Complexo Industrial e Portuário de Suape – CIPS planeja realizar. As obras consistem no alargamento e aprofundamento do canal de navegação do Estaleiro Vard Promar, a fim de viabilizar o acesso de navios petroleiros e de minério, mas para as comunidades pescadoras artesanais da região, trata-se de mais uma grande ameaça a seus territórios de pesca. A concentração deu-se às 7h da manhã na Praia de Suape, de onde as/os pescadoras/es saíram em “barqueata”, entoando em uma só voz “no rio e no mar: pescadores em luta!”. Os barcos se dirigiram à Ilha de Cocaia (onde a empresa planeja depositar os sedimentos provenientes das obras).
Quando a barqueata aportou na Ilha de Cocaia por volta das 9h30, algo que imediatamente chamou a atenção de todos/as foi o forte cheiro de óleo e o fato de que a areia estava impregnada do combustível diesel que será utilizado nos caminhões encarregados de fazer o transporte dos sedimentos pela ilha, revelando mais uma face do constante descuido com as questões ambientais por parte da empresa, que sequer é capaz de fazer uma contenção eficiente para o óleo, que vazava aos montes e já chegava ao mar.
O atos das/os pescadoras/as teve o intuito de barrar as obras de dragagem no canal de navegação do Estaleiro, comunicadas pela empresa somente 11 dias antes da data prevista para o início das obras, numa reunião convocada às pressas com uma pequena comissão de pescadores/as. As/os pescadores reivindicam um debate amplo com toda a comunidade pesqueira e um estudo minucioso dos impactos das obras sobre a vida das comunidades tradicionais que dependem daquele ecossistema para sobreviver. Estudos dessa natureza são algo que Suape sempre negligenciou em todas as suas atividades. Esquecidas, para Suape é como se essas comunidades sequer existissem.
A notícia de novas obras de dragagem surge quase que exatamente um ano após o Complexo Industrial Portuário de Suape ter sido condenado pela Justiça Federal pelos danos socioambientais decorrentes de atividades de dragagem e de derrocagem executadas entre os anos de 2008 e 2013. Na ocasião, foi imposta à empresa pública a execução de uma série de medidas para remediar tais danos, cujo cumprimento até o momento não foi comprovado. Percebe-se, portanto, a postura de escárnio por parte da empresa pública do estado de Pernambuco para com as comunidades pescadoras, as leis e o próprio Judiciário.
As novas dragagens incidirão no que restou de território pesqueiro próximo à Ilha de Tatuoca, região que foi quase completamente destruída para a instalação do Estaleiro Vard Promar no ano de 2013. Àquela época, quando o mangue da Ilha de Tatuoca foi inicialmente dragado para a abertura do canal de navegação, as/os pescadores/as ficaram mais de 1 (um) ano sem conseguir pescar no local. A lama decorrente da dragagem matou inúmeras espécies de animais que viviam nos manguezais; restou apenas um cheiro intenso de morte e putrefação. Além disso, toda a movimentação sedimentológica e a falta de controle sobre os resíduos decorrentes do processo de dragagem tem provocado o adoecimento (coceiras, ferimentos na pele, problemas ginecológicos) das/os profissionais da pesca, principalmente marisqueiras, que trabalham na região.
“Isso aqui tudo era mangue” foi uma das falas que mais se ouviu, durante o ato público, de pescadores e pescadoras, que fitavam com tristeza seu antigo território pesqueiro, hoje em parte destruído e que agora Suape quer destruir ainda mais. O local é um dos poucos que ainda abrigam guaiamuns, espécie protegida pela Portaria do MMA n.º 445/2014, por estar em extinção. As dragagens na área próxima à Ilha de Tatuoca, bem como o depósito de sedimentos na Ilha de Cocaia, vão destruir mais uma vez os mangues e os territórios pesqueiros de mariscagem, que Suape insiste em negar que existam.
Laílson, Vice-Presidente da Colônia Z-08, chamou ainda a atenção para o fato de que os sedimentos removidos do fundo acarretarão o soterramento de áreas rochosas, onde se formam substratos orgânicos fundamentais para reprodução de lagostas e outras espécies marinhas.
Somente por volta do meio-dia, após horas de exposição ao sol e à chuva, os/as pescadores/as puderam contar com a presença de representantes do CIP-Suape no local. Com respostas vagas e incongruentes às reivindicações apresentadas, os representantes da empresa tentaram minimizar os impactos futuros e os já produzidos. No entanto, diante da posição firme e incisiva das/os pescadoras/es, a empresa se viu obrigada a recuar, a suspender, por ora, o início das novas dragagens e a abrir um diálogo transparente e mediado pelo Ministério Público Federal com as comunidades atingidas.
A suspensão das obras, mesmo que momentânea, e a abertura de um diálogo mediado pelo MPF é uma significativa vitória da mobilização popular. As/os pecadoras/es seguem firmes nessa caminhada. A luta é pela preservação do meio ambiente, por respeito para com as populações tradicionais da região e pelo fim da invisibilização historicamente promovida por Suape contra as comunidades locais. As comunidades atingidas pelo CIPS não são invisíveis. Elas existem, são fortes e exigem seus direitos!
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