Edição de Outubro de 2016 – nº 04
Vitória dos pescadores e pescadoras
SUAPE CONDENADA POR DANOS SOCIOAMBIENTAIS NA JUSTIÇA FEDERAL
Na última sexta-feira (07) o Juiz Federal da 35ª Vara da Subseção do Cabo de Santo Agostinho reconheceu que o Complexo Industrial Portuário – SUAPE tem provocado graves danos ao meio ambiente marinho e às populações que sobrevivem da pesca. A empresa de capital misto administrada pelo Governo do Estado de Pernambuco foi condenada a realizar uma série de medidas mitigadoras e compensatórias dos danos que cometeu.
Em 2011, o Ministério Público Federal ajuizou uma Ação Civil Pública a partir de uma Representação formulada pela Colônia de Pescadores Z-8, a qual denunciava uma série de danos socioambientais decorrentes das atividades de dragagem e de derrocagem. Os pescadores alegavam que desde o início das atividades o estoque pesqueiro tem diminuído drasticamente, chegando hoje a uma queda de, no mínimo, 50%.
As dragagens consistem na retirada de sedimentos do fundo oceânico para afundamento de leito, a fim de permitir acesso dos navios ao porto. Demandam também a existência de extensas áreas para depósito do material dragado, chamadas de “bota-fora”.
No entanto, as áreas dragadas (que correspondem ao canal de acesso e às bacias de manobra), às quais o acesso dos pescadores ficou proibido, coincidem com vários “cabeços”, como são chamados os pontos de pesca pelos pescadores. São áreas normalmente formadas por corais e ricas em biodiversidade, que agora estão inacessíveis à comunidade pesqueira. Além disso, as áreas escolhidas para bota-fora também cobriram de sedimentos outros pontos de pesca, acarretando a mortandade dos animais. Um bota-fora específico localizava-se muito próximo à praia, e, pela ação das marés e dos ventos, seus sedimentos se alastravam para outras partes, atingindo, inclusive, as regiões de mangue.
Agravando a situação, a partir de 2008, a empresa passou a utilizar-se também de atividades de derrocagem (explosões) para quebrar o assoalho oceânico e viabilizar novas dragagens. As explosões intensificaram os impactos das dragagens. Segundo Edinaldo Rodrigues de Freitas, pescador da região e presidente da Associação dos Pescadores e Pescadoras Profissionais em Atividade do Município do Cabo, após as explosões, milhares de peixes apareciam mortos na beira do mar. A CPRH, em 2013, chegou a lavrar dois autos de infração contra SUAPE após notícias de mortes de peixe Mero e de Boto Cinza, espécies ameaçadas de extinção e protegidas por lei.
Um dos pontos abordados pelo Ministério Público Federal na Ação Civil Pública é que as atividades foram desempenhadas com base em estudos que não previam os impactos ambientais que recairiam sobre a atividade da pesca artesanal desempenhada na região nem as medidas mitigadoras e compensatórias adequadas.
Os impactos ambientais no ecossistema marinho, ao afetarem diretamente populações pesqueiras artesanais e sua atividade de subsistência, tomaram também a dimensão de impactos sociais. Muitas das famílias que viviam da fartura de peixe e de lagosta ou, ainda, da riqueza do mangue, hoje experimentam a miséria e muitas privações.
Sobre os impactos sofridos pela comunidade pesqueira da região, Edinaldo Rodrigues de Freitas afirma que os pescadores “antes viviam bem, não precisavam pedir nada a ninguém. Comiam bem e ainda distribuíam para quem não tinha. A atividade pesqueira também movimentava a cultura do povo da pesca. Muitas festas populares giravam em torno dessa identidade da comunidade pesqueira. Antes o pescador conseguia fazer de quatro a cinco salários mínimos por mês. Hoje ele pesca o mês todinho para conseguir, no máximo, R$800,00. Isso desanimou os nativos de manter até a cultura que tinham. Também sofreram danos psicológicos, por agora terem que viver de esmola e doação de cesta básica, quando antes viviam na fartura”.
Os impactos socioambientais nos territórios pesqueiros decorrentes das atividades de SUAPE foram constatados, ao longo do processo judicial, por inúmeros pareceres técnicos da CPRH e do MPF. Com base nesses documentos técnicos e nas manifestações do MPF e da Colônia de Pescadores Z-8, SUAPE foi condenada a executar medidas de caráter mitigador e compensatório, como as que impliquem a recuperação dos estoques pesqueiros.
Outras medidas constantes na sentença foram: Mapeamento dos habitats submarinos na área de influência direta e indireta de Suape; quantificação das áreas pertencentes ao território da pesca artesanal que foram apropriadas e/ou impactadas direta ou indiretamente pelo porto de SUAPE; mapeamento do território tradicional da pesca artesanal, segundo informações dos pescadores que utilizam a área, incluindo os mestres de embarcações, em conjunto com pesquisadores com experiência em categoria social; adoção de medidas de proteção do território tradicional da pesca artesanal, diante dos riscos das atividades portuárias e outras ameaças; adoção de medidas de proteção do Peixe Mero, Boto-Cinza e outras espécies da fauna impactadas, tanto nos locais de impacto direto quanto em áreas impactadas indiretamente; adoção de medidas de mitigação dos impactos potenciais para futuras atividades de derrocagem.
Segundo a assessoria jurídica que acompanhou a Colônia de Pescadores Z-08 no processo, “as pescadoras e os pescadores têm denunciado esses impactos há muito tempo. O poder econômico e político de Suape, no entanto, fez com que essas denúncias fossem abafadas. Exemplo disso é o fato de os dois únicos autos de infração referentes às atividades de dragagem lavrados pela CPRH contra SUAPE terem sido fulminados com argumentos tecnicamente vazios e que não desconstruíam o relatório técnico utilizado para embasar as autuações. O relatório era um documento bastante rico e contundente, tanto que foi utilizado pela Justiça Federal na sentença para condenar a empresa. Vê-se, então, que, se já é difícil o Estado investigar danos socioambientais provocados por particulares, quando a relação é dentro do próprio Estado, no caso, entre uma autarquia estadual (CPRH) e uma empresa de capital misto administrada pelo Estado (Suape), a situação tende a ser ainda mais [difícil]. É por isso que essa sentença deve ser comemorada como um importante precedente. Ela reconhece a luta das pescadoras e pescadores pelo respeito ao seu território pesqueiro e contra os impactos socioambientais causados pelo Complexo Industrial Portuário-SUAPE”.
DELIMITAÇÃO DE TERRA É PAUTA DE REUNIÃO DA SPU
No dia 12 de setembro, representantes do Fórum Suape participaram de uma reunião com a Superintendência do Patrimônio da União – SPU para tratar do procedimento de delimitação da terra da União no Engenho Ilha. A pauta da reunião era a retomada da discussão quanto à concessão do direito de ocupação aos posseiros e o requerimento de um levantamento topográfico da área. O primeiro ponto restou um pouco prejudicado na prática, porque o superintendente estava deixando o cargo em quinze dias. Portanto, o Fórum deverá agendar outra reunião com o novo superintendente. Quanto ao segundo ponto, a SPU não dispõe de equipamento para realizar levantamentos topográficos. A saída apontada é que, por conta própria, ou buscando outras instituições, esse trabalho seja realizado e apresentado à Superintendência.
Na ocasião foi encaminhado um ofício à SPU solicitando que se retome a discussão sobre a concessão do direito de ocupação da área à Sociedade dos Pequenos Agricultores de Ponte dos Carvalhos, que a SPU-PE se comprometa em manter o seu posicionamento de não conceder o aforamento à empresa Suape e que realize mapeamento da área para esclarecer, de uma vez por todas, as dúvidas quanto aos limites das terras da União.
FÓRUM ENVIA CARTA DENÚNCIA À UNESCO
Uma das estratégias do governo de Pernambuco para legitimar suas ações no Complexo Industrial e Portuário de Suape (CIPS) foi celebrar um convênio com a UNESCO na perspectiva de se fortalecer do ponto de vista socioambiental, através do programa Pacto Suape Sustentável. Diante desse fato, a primeira reação do Fórum Suape foi de total estranheza, por esse motivo, no início de setembro, enviou uma carta a UNESCO buscando esclarecimentos quanto a essa “parceria” e denunciando os desmandos praticados pelo CIPS na região.
Na carta direcionada à diretora geral da UNESCO, Irina Bokova, ao representante brasileiro naquele órgão, Lucien André Muñoz, e a consultora para o Pacto Suape Sustentável, Milena Rego, o Fórum Suape expressa sua preocupação quanto à conduta da UNESCO no Estado de Pernambuco e questiona os termos de cooperação técnica que são firmados. Para o Fórum Suape o CIPS é responsável por inúmeras violações dos direitos humanos e por manter uma milícia armada atuando na região, num total desrespeito aos direitos sociais e ambientais das comunidades tradicionais e dos ecossistemas nativos, ambos, profundamente afetados.
O Pacto Suape Sustentável se concretiza na formalização da Cooperação Técnica firmada entre o Estado de Pernambuco e a UNESCO (PRODOC número 914BRZ3022) sob a responsabilidade da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico e do CIPS, avaliado em R$ 1.288.035,00. É sabido que os recursos para viabilizar essa cooperação foram garantidos pelo CIPS. “A natureza desse PRODOC e a associação entre UNESCO e CIPS constitui matéria de preocupação e interesse da sociedade civil e requer uma rápida resposta por parte da UNESCO”, diz a carta. Ela destaca que a área demandada pelo CIPS constitui território tradicional, tendo sido habitada por mais de 25.000 pessoas durante várias gerações, que milhares de famílias foram expulsas de modo forçoso e violento, privadas de suas casas e suas terras, que atualmente são mais de 10.000 pessoas habitando esse território, expostas à brutalidade e às atrocidades diárias praticadas pelo CIPS. A carta denuncia ainda a presença de uma milícia armada, contratada pelo CIPS, que constantemente ameaça as famílias tradicionais e sua segurança.
“A existência dessa milícia foi tornada pública através dos vários meios de comunicação e mídias, bem como em reuniões e audiências com organismos de governos municipais, estaduais e federais”, diz a carta, que também informa que o escritório local da UNESCO em Pernambuco foi alertado sobre a situação. A carta denuncia que o desmatamento de milhares de hectares de ecossistemas nativos agravou o cenário de degradação, com a contaminação das águas, dos solos e de espécies nativas, colocando em risco as comunidades locais. Por fim, aponta as consequencias da atração de grandes contingentes humanos de outras localidades para empregos temporários na região, culminando na segunda maior demissão em massa da história do país, com aproximadamente 45.000 pessoas desempregadas nos últimos três anos.
Referindo-se a missão da UNESCO, a carta levanta um questionamento quanto ao acordo de cooperação técnica, requisita informações e critica a maneira como ele foi conduzido. O Fórum Suape solicita que a UNESCO revise a execução do termo de colaboração técnica, no intuito de salvaguardar a coerência com a sua sólida história e missão, como Agência da ONU. Nesse sentido, a carta faz críticas severas quanto a ausência de consulta pública a grupos locais e partes interessadas na proposta do PRODOC, assim como de estruturas participativas e canais de comunicação. Diz que o acordo falha ao não considerar expertises locais, informações e estudos independentes ou autônomos que contrastam com as informações oficiais compartilhadas pelo CIPS com a UNESCO e que nortearam as linhas de base do PRODOC. Falha ao não considerar os inúmeros processos judiciais contra o CIPS, que expõem casos de violações severas aos direitos humanos e ambientais. Aponta ainda a falta de esclarecimento em relação ao posicionamento da UNESCO com respeito às expulsões forçosas e violentas levadas a cabo pela milícia do CIPS e o papel desenvolvido pela UNESCO no contexto da demarcação da área do Parque Metropolitano Armando Holanda Cavalcanti, fazendo uso de arames farpados e cercas em áreas de uso das comunidades tradicionais, impedindo seus acessos aos recursos naturais e ao seu território tradicional de vida.
VOCÊ SABIA?
FÓRUM CONTRIBUI COM RELATÓRIO DA ONU
O Fórum Suape participou da elaboração do Relatório para a Revisão Periódica Universal – RPU da ONU (Organização das Nações Unidas), desenvolvendo os pontos que se referem às violações aos direitos e às suas repercussões na vida dos posseiros da região do CIPS, no município do Cabo de Santo Agostinho.
PLANTÃO JURÍDICO SEMANAL
O Fórum Suape – Espaço Socioambiental oferece orientações jurídicas, através de um Plantão Advocatício, que acontece todas as terças-feiras, no horário das 9 às 12h e das 13 às 16h. A sede do Fórum Suape está situada na Rua Padre Antonio Alves de Souza, 20, Centro – Cabo de Santo Agostinho (ao lado do Centro das Mulheres do Cabo).
Os serviços oferecidos são: orientação aos moradores sobre como agir diante violências cometidas pela empresa Suape; orientação sobre a importância de regularização das associações (verificar o estatuto, datas, mandatos, realização de assembleias, etc); realização do cadastramento das comunidades; e atendimento a outros assuntos e situações semelhantes.
COMPLEXO INDUSTRIAL E PORTUÁRIO DE SUAPE: UM RASTRO DE VIOLÊNCIA E DESTRUIÇÃO DA VIDA
O modelo de desenvolvimento que está por trás do Complexo Industrial e Portuário de Suape – CIPS, em Pernambuco, comprova a cada dia o quanto ele funciona como uma usina geradora de violência e violações dos direitos humanos contra a população nativa e tradicional que habita aquela região. Esta é a realidade de Suape que não estamos acostumados a ver na imprensa ou nas propagandas oficiais de governos e eleitorais de candidatos.
Acostumado a se propagandear aos quatro cantos do mundo como empresa sustentável, recebendo inclusive prêmios internacionais, o CIPS mantém em sua estrutura interna uma Diretoria de Gestão Fundiária e Patrimônio que funciona com um tripé muito bem concatenado. À sua frente está o diretor Sebastião Pereira Lima, mais conhecido como coronel Pereira, que exerce uma diretoria cativa, muda-se a presidência de Suape, entram e saem seus dirigentes, mas ele continua firme intocável em sua diretoria. Para realizar o serviço sujo nas comunidades o coronel de Suape conta com o braço forte do Sr. Romero Correia da Fonseca, funcionário do CIPS, um verdadeiro jagunço encarregado de praticar todo tipo de violência nas comunidades, comandando uma milícia armada e truculenta (conforme denúncia dos moradores) que derruba casas, destrói cercas, plantações e expulsa famílias na região. Para completar o tripé da maldade, Suape conta com a intervenção do seu departamento jurídico no qual tem se destacado a presença da jovem advogada Caroline da Frota Cavalcante.
Um dos casos emblemáticos é o do Sr. Luís Abílio da Silva, o seu Abílio, atualmente com 85 anos e sua esposa dona Maria Luiza da Silva, 5 anos, que tiveram a casa derrubada no sítio do Engenho de Tiriri, no dia 22 de maio de 2013. Cercado dos filhos e dos 18 netos, seu Abílio relembra como tudo aconteceu. “Estava em casa com minha esposa, nora, filhos e netos quando a guarda chegou com o oficial de Justiça para nos retirar de lá. Eu estava sentado, fui retirado pelo braço. Minha nora com meu neto de 15 dias, também, foram obrigados a sair. A casa foi derrubada”.
No dia 4 de abril deste ano, Severino Cassiano da Silva, conhecido como Biu, olhou pela última vez da janela de sua casa para as águas do rio Massangana. Na manhã daquele dia, o último morador da Ilha de Tatuoca foi forçado a assistir a demolição de sua casa, seu bar e de tudo o que era seu. Seu destino seria traçado pela mão criminosa e gananciosa do Complexo Industrial e Portuário de Suape, com a cobertura do Estado. Dezenas de homens armados, metralhadoras às claras, carros, tratores foram usados em mais esse ato de total desrespeito aos direitos daquele morador indefeso, no final deixaram apenas os escombros.
Ao contrário de ser uma empresa sustentável, de acordo com a propaganda, o que se constata é que o CIPS não está nem aí com a vida. Gerador de tanto sofrimento deixa um rastro de doenças físicas e psicológicas, para além da destruição ambiental e de sonhos de milhares de trabalhadores que foram para Suape iludidos com promessas desenvolvimentistas e de melhoria financeira e material.
Nos dois casos, os moradores estão sofrendo as consequências da violência do CIPS. Seu Abílio nunca mais voltou ao normal, vive doente sem poder trabalhar, dependendo da ajuda de familiares e amigos. Seu Biu ficou muito abalado e na gravação de uma entrevista para um vídeo do Fórum Suape (Fragmentos de um Ecocídio) fica evidente o seu estado emocional, um homem em estado de choque que mal consegue falar. As últimas notícias são que ele se encontra hospitalizado, entubado e seu estado de saúde é muito delicado. Taí o resultado da empresa sustentável na vida das pessoas. Que sustentabilidade é essa que destrói e promove o desequilíbrio socioambiental? Que sustentabilidade é essa que, ao invés de preservar e proteger, mata?
EXPEDIENTE – Editado pela Assessoria de Comunicação do Fórum Suape – Espaço Socioambiental. Endereços: Rua Padre Antonio Alves de Souza, 20, Centro – Cabo de Santo Agostinho/PE (ao lado do Centro das Mulheres do Cabo). Escritório Recife: Rua do Espinheiro, 812 – sala 101 (1o andar) – Galeria Francisco Accioly, bairro do Espinheiro, Recife/PE. Acesse a nossa página na internet: www.forumsuape.ning.com / Telefones: (81) 99102.3883 (Claro) e 98536.2204 (Oi). E-mail: forumsuape@gmail.com
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Assessor de Comunicação: Gerson Flávio da Silva (DRT/PE 1.659).
Assessoria Jurídica: Luísa Duque e Mariana Maia.
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Colaboração: Karine Raquel.
Secretária Executiva: Betânia Araújo.
Contato com a Assessoria de Comunicação: (81)99509.3043.
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