Abertura do Seminário: Complexo Industrial Portuário de Suape (CIPS): Desenvolvimento e os Impactos Socioambientais
Heitor Scalambrini CostaCoordenador do Forum Suape
Bom dia!!
Hoje, um momento muito especial estaremos vivenciando.
Graças ao Laboratório de Saúde, Ambiente e Trabalho (LASAT), da direção do Instituto Ageu Magalhães, e da Associação Forum Suape Espaço Socioambiental, teremos a oportunidade de refletir/reagir, analisar, discutir questões sociais e ambientais provocadas pela maior empresa estatal de Pernambuco, o CIPS – Complexo Industrial Portuário de Suape.
Algo pouco comum no meio acadêmico deste Estado estará ocorrendo hoje, aqui e agora. Um debate público, onde se ouvirá a voz daqueles e daquelas que estão no centro dos conflitos, e que sofrem diretamente as consequências socioambientais dos empreendimentos, que chegam anunciados como redentores e dinamizadores da economia do Estado. Como geradores de empregos e renda. Como salvadores da pátria. Sem nenhuma discussão democrática com a sociedade.
Antes de mais nada seria aqui importante pontuar nosso entendimento sobre o que venha a ser impacto socioambiental utilizado no próprio nome deste Seminário.
A expressão “impacto” é extraída da física, da parte que estuda os choques, as quantidades de movimento e as deformações nos corpos submetidos.
A lei de Newton (forças de ‘ação’ e ‘reação’), é utilizada para medir o “impacto”, expresso em Newtons (N). Também é utilizada a unidade kgf que equivale a 9,8 N.
Não me parece adequado caracterizar como “impactos” os processos sociais e territoriais da implantação de grandes empreendimentos, usinas hidrelétricas, barragens, complexos industriais, portuários, afins.
A palavra “impacto” tornou-se meramente administrativa, prescrita para ser utilizada nos processos de licenciamento ambiental, mas contra producente em termos científicos e impeditiva para o avanço do conhecimento, tornando-se tão somente uma noção desviacionista.
O termo “impacto” vem sendo utilizado de forma indistinta quando o correto seria apontar que determinada obra traz perdas, prejuízos, danos, desastres, expulsões, expropriações, desaparecimentos, privações, ruínas, desgraças, destruições, de vidas e de bens, muitas vezes permanentes e irreversíveis.
É disso que realmente se trata quando analisamos as consequências de determinados empreendimentos para as populações atingidas, e para os ecossistemas.
É necessário pois, levantar o véu dos “impactos”, desnudar as aparências e tornar concreta a realidade imposta às populações atingidas e aos ecossistemas por estes empreendimentos, inclusive o da empresa estatal CIPS.
A proposta deste Seminário é discutirmos um empreendimento do porte do CIPS, “além do capital”. Além do número e a quantidade de produtos que circula neste porto. Da receita produzida e das divisas obtidas pelas grandes corporações que ali estão localizadas com seus parques fabris ou de logistica. A capacidade de movimentação de petróleo e derivados. Da ampliação dos parques de tancagem.
Na verdade creio que a discussão que devemos travar passa necessariamente pelo questionamento da inserção desta empresa estatal em um sistema, em uma lógica, que perdeu sua capacidade civilizatória, e no atual estágio para manter-se, torna-se cada vez mais destrutiva de direitos, da vida de milhões de seres humanos e da natureza, colocando em risco o próprio planeta Terra.
Não devemos nos contentar nestas discussões, somente em reformar o sistema do capital, mas ir além dele. Que as soluções que venhamos propor não sejam apenas formais, mais essenciais.
Hoje, como tarefa fundamental, de todos e todas que lutam e acreditam que um novo mundo possível é de construir um pensamento junto a sociedade que seja contra hegemônico e antagônico ao que está estabelecido.
Temos que fortalecer o combate ao economissismo, as visões reformistas, ao modismo pós moderno.
Temos que passar uma mensagem a sociedade que tenha como parâmetro o ser humano, o meio ambiente, isto exige superarmos a lógica desumanizadora do capital, que tem no individualismo, no lucro, e na competição seus fundamentos.
Transformar estas idéias e princípios em práticas concretas é uma tarefa que exige ações que vão muito além das salas de aula, dos gabinetes, dos foruns acadêmicos.
Temos que sair as ruas, para os espaços públicos, e se abrir para o mundo.
Construir uma ruptura com a lógica capitalista. O sistema do capital não é eterno, e expressa contradições insanáveis. A destruição deste sistema corresponde a salvação da vida, como entendemos, em nosso planeta.
Acredito que a construção de um novo mundo é possível. E começa em construir uma educação cuja principal referência seja o ser humano. Uma educação que realize as transformações politícas, econômicas, culturais e sociais necessárias.
Hoje iremos discutir um grande empreendimento, o maior, em nosso Estado em processo de implantação, e seus reflexos na vida das pessoas, das populações tradicionais que viviam e vivem naquele território. Entendemos que as mais de 100 indústrias instaladas, os investimentos em torno 50 bilhões de reais com dinheiro público, não afetaram e se restringiram apenas aos 13.500 ha do território onde se localiza o empreendimento. Ou mesmo, as 15.000 famílias que ali viviam e vivem. Mas, sobretudo, afetaram também os municípios vizinhos do Cabo de Santo Agostinho e Ipojuca, mas todo Estado de Pernambuco que tiveram restrições de investimentos, pela concentração dos investimentos públicos no CIPS.
O Seminário foi assim organizado. Pela manhã o painel “Saúde e modos de vida no território do CIPS” terá como palestrantes profissionais que conhecem muito bem o território, e que tem acompanhado de perto, o real significado da chegada deste empreendimento nas vidas dos moradores e moradoras do entorno do Complexo. A profa. Idê Gurgel desta casa, a Rafaela Nicola ecóloga e assessora do Forum Suape, e a profa. Joanna Lessa da Universidade Rural darão suas contribuições ao debate. A moderação será da pesquisadora desta casa a Dra. Aline Gurgel.
A vozes das comunidades serão ouvidas neste auditório, através de depoimentos de moradores/moradoras relatando todas suas angústias e dramas vividos. É importante que se saiba que em Suape tem gente vivendo lá.
Pela tarde o painel “Ecossistemas no território do CIPS” contará com o visionário, e que já antevia a destruição e as mudanças drásticas e dramáticas do território de Suape, o prof. Clovis Cavalcanti. Além da profa. Maria das Graças do Departamento de Serviço Social da UFPE, e do diretor de Meio Ambiente e Sustentabilidade da empresa CIPS, Jorge Araújo, que apesar de convidado não deu nenhuma resposta ao convite dos organizadores. A moderação será da pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco Edneida Cavalcanti. E logo após um coquetel será servido.
Esperamos assim estar contribuindo para que este debate, que envolve temas tão importantes neste momento para a sociedade brasileira, possa ganhar o interesse da sociedade pernambucana.
O “tudo se vende”, o “tudo se compra”, o “tudo tem preço” está levando nossa civilização a um momento crucial em sua historia.
Um basta a mercantilização dos bens comuns, da água, das florestas, dos manguezais, da biodiversidade, e o respeito aos modos de vida das populações tradicionais é para ontem. Estas populações tradicionais tem muito a nos ensinar de como “bem viver”.
Um bom Seminário.
P.S.: Me apropriei, por concordar integralmente, das discussões sobre impactos travadas pelo prof. Célio Bermann em um texto seu sobre o tema.