A possibilidade de ser atacado por um tubarão existe em qualquer ponto do litoral brasileiro. Em nenhum lugar, porém, esse risco é mais real do que nas praias da região metropolitana do Recife. Um problema que parecia estar ficando submerso nos últimos anos, mas voltou à tona de forma dramática na semana passada, com a morte da jovem Bruna Gobbi, de 18 anos.
Foi o segundo ataque de tubarão seguido de morte neste ano no litoral de Pernambuco, e o segundo em menos de um ano em Boa Viagem, que é a principal praia da capital. Desde 1992, foram registrados 59 ataques no Estado, 85% dos quais ocorreram numa faixa de 30 quilômetros da região metropolitana de Olinda, Recife e Jaboatão dos Guararapes, segundo dados do Comitê Estadual de Monitoramento de Incidentes com Tubarões (Cemit).
A média de ataques registrados em todo o resto da costa brasileira, comparativamente, é de quatro a cinco por ano, de acordo com o especialista Otto Gadig, da Universidade Estadual Paulista (Unesp). “Recife é um negócio totalmente fora do normal, sem dúvida nenhuma”, diz o pesquisador, que passou vários anos estudando os ataques da região na década de 1990.
Ele acredita até mesmo que o número de casos pode ser maior do que indicam as estatísticas oficiais. Segundo ele, é possível que muitos corpos que são resgatados do mar com marcas de mordida e interpretados pelos legistas como casos de afogamento seguido de ataque sejam, na verdade, casos de ataques seguidos de morte. “É uma teoria que não tenho como provar, mas acredito seriamente nisso”, disse Gadig ao Estado.
“Não acho que tenham sido só 59 ataques, e não acredito que tenham sido 59 tubarões diferentes”, diz o pesquisador.
Ele acredita que o problema não é o número de tubarões na região do Recife – que não seria muito diferente do de outras capitais do Nordeste, onde há bem menos ataques -, mas o comportamento dos animais, que parece estar alterado por causa da degradação dos ecossistemas costeiros e outras alterações ambientais na região.
Responsabilidade. Essa, também, é a avaliação de pesquisadores locais. Para a oceanógrafa Rosangela Lessa, presidente do Cemit e pesquisadora da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), não há dúvida de que o número excessivo de ataques resulta de interferências humanas no ambiente – a maioria delas ligada ao complexo portuário de Suape, ao sul do Recife, construído nas décadas de 1980 e 1990.
O porto teria causado uma série de impactos ambientais – incluindo mudanças na salinidade da água e destruição de ecossistemas recifais e estuarinos – que forçaram os tubarões da região a se deslocar para o norte. O resultado, somando-se ainda vários outros fatores, é que um número maior de tubarões de espécies agressivas – como o tigre e o cabeça-chata – agora vive próximo às praias de uma região metropolitana densamente povoada e em condições ecológicas pouco ideais, que favorecem os ataques.
A melhor solução, segundo Rosangela, é que as pessoas obedeçam às orientações de segurança. “Tubarões não podem ser educados, mas as pessoas podem”, diz. Todas as praias da região metropolitana são amplamente sinalizadas com placas alertando para a presença de tubarões, além das orientações que são dadas regularmente aos banhistas pelos guarda-vidas do Corpo de Bombeiros.
O Cemit é contra qualquer solução que implique em matar tubarões. “Fomos nós que causamos o problema; a responsabilidade é nossa, não dos tubarões”, diz o cientista Fabio Hazin, também da UFRPE. “Não queremos piorar ainda mais um problema ambiental que já é complexo”, diz Rosângela.