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CARTA ABERTA A PRESIDENTE DILMA

44 entidades e especialistas subscrevem carta aberta à Presidenta Dilma Rousseff, que apresenta propostas para restabelecer estoques marinhos; redução ameaça paralisar o setor pesqueiro
A presidenta Dilma Rousseff recebeu, nessa quarta-feira (14), carta aberta assinada por 16 entidades ligadas à pesca e 28 especialistas, na maioria cientistas pesqueiros dedicados ao estudo e conservação de recursos marinhos, com propostas de mudanças estruturais para a política pesqueira nacional. Apoiada tanto por cientistas, organizações de proteção ao meio ambiente, lideranças da pesca industrial e da pesca artesanal, a carta representa um consenso inédito no setor e defende a adoção de uma política qualificada de pesca para o Brasil, baseada em dados e diagnósticos confiáveis, que garanta a sustentabilidade da atividade pesqueira no longo prazo.
Para enfrentar os problemas do setor, as entidades e especialistas propõe na carta aberta um conjunto de cinco ações necessárias para um adequado ordenamento pesqueiro: a regulamentação e implantação imediata do Sistema Nacional de Informações de Pesca e Aquicultura (SINPESQ), aprovado há 20 anos e até hoje não regulamentado; investimentos em pesquisa; adequação do marco legal; elaboração de planos de manejo para as pescarias e planos de recuperação de estoques de espécies capturadas em excesso; e investimentos em fiscalização e combate à pesca ilegal.
Articulada pela organização não governamental Oceana Brasil, a carta é divulgada no momento em que o setor da pesca atravessa uma grave crise: a recente divulgação da listade espécies brasileiras ameaçadas de extinção revelou que 97 espécies de peixes marinhos, muitas delas exploradas comercialmente, estão em risco e podem ter sua captura proibida; em decorrência, vários incidentes foram registrados, como o fechamento de portos na Região Sul por pescadores. “O problema não é apenas ambiental, mas também econômico e social. Somente o ordenamento pesqueiro eficiente, baseado em dados científicos, pode oferecer uma solução viável e definitiva”, defendeu Mônica Brick Peres, diretora geral da Oceana Brasil e vice-presidente da Oceana Internacional.
Pesca no Brasil
A carta destaca que o Brasil está entre os 30 maiores produtores de pescado no mundo; a atividade reúne cerca de um milhão de pescadores profissionais e 42 mil embarcações, gerando mais de 3,5 milhões de empregos diretos e indiretos. A pesca artesanal é responsável por, pelo menos, 50% da produção de pescado nacional e é fundamental para a geração de renda e a segurança alimentar do país.
Apesar de sua importância, a maioria das pescarias não tem qualquer controle ou normatização no Brasil: apesar do contínuo aumento da capacidade, da expansão das áreas de pesca e da substituição de espécies, a produção da pesca marinha caiu desde meados da década de1980 e está estável há mais de 20 anos, devido à pesca excessiva e mal ordenada. A atividade ainda enfrenta ameaças como a pesca ilegal e irregular, praticada por barcos piratas ou realizada em áreas, épocas e com aparelhos de pesca proibidos, entre outros.
(Oceana Brasil)
Veja a íntegra da carta aberta abaixo

Carta aberta à Presidenta Dilma Rousseff

Excelentíssima Presidenta da República
Senhora Dilma Vana Rousseff
Neste momento em que Vossa Excelência dá início ao seu segundo mandato, entidades e pesquisadores dedicados ao estudo e conservação de recursos marinhos, assim como sindicatos e representações do setor pesqueiro nacional vêm respeitosamente apresentar suas percepções e demandas para as mudanças estruturais necessárias à política pesqueira nacional.
A importância socioeconômica e cultural da pesca no Brasil é inquestionável. O país está entre os 30 maiores produtores de pescado no mundo. A atividade reúne cerca de um milhão de pescadores profissionais e 42 mil embarcações, gerando mais de 3,5 milhões de empregos diretos e indiretos. A pesca de pequena escala é responsável por, pelo menos, 50% da produção de pescado nacional e é muito importante para a renda, a segurança alimentar e a manutenção do modo de vida de milhares de comunidades pesqueiras do país. As histórias de pescadores, do mar e suas fascinantes criaturas estão profundamente arraigadas na cultura, valores e religião do nosso povo. A manutenção de todos esses bens e serviços tem baixo custo para o país, mas a perda de empregos, renda e alimentos ligados à atividade não pode ser substituída.
Como é de seu conhecimento, os recursos pesqueiros são patrimônio público sob tutela do Estado e o direito de explorá-los economicamente é uma concessão do Poder Público, que deve proteger os direitos da coletividade. É obrigação constitucional do Estado brasileiro garantir a gestão adequada e a repartição justa dos benefícios socioeconômicos decorrentes da exploração desse patrimônio, em harmonia com a conservação do meio ambiente e da biodiversidade. A manutenção dos benefícios da pesca deveria ser considerada da mais alta prioridade para o Estado brasileiro.
Infelizmente, nossas pescarias têm sido mal manejadas ou simplesmente ignoradas, causando enorme prejuízo socioeconômico e ambiental. A produção anual da pesca extrativa marinha nacional atingiu um máximo de 750 mil toneladas em meados da década de 1980, caindo para 400 mil toneladas nos anos subsequentes. Desde 1990, apesar do contínuo aumento da capacidade de pesca, do número de barcos, da expansão das áreas de pesca tradicionais e da substituição continua de uma espécie-alvo por outra, a produção da pesca marinha nacional tem se mantido entre 400 e 550 mil toneladas ao ano. Essa aparente estabilidade significa, na verdade, uma sucessão de pescarias colapsadas por exploração acima da capacidade de suporte dos estoques, ou seja, por pesca excessiva e mal ordenada. Isso tem gerado enormes prejuízos econômicos para o setor pesqueiro e também prejuízos sociais e ambientais de difícil recuperação. Outro problema grave que contribui para as perdas socioeconômicas e ambientais é a pesca ilegal e irregular. Barcos piratas, pescarias em áreas, épocas e com aparelhos de pesca proibidos, captura de espécies proibidas e ainda a descaracterização e venda de pescado fraudado são muito comuns no Brasil.
No Brasil, a maioria das pescarias não tem qualquer controle ou normatização. Para aquelas consideradas “manejadas”, as medidas restringem-se a tamanhos mínimos de captura ou restrições de épocas e de aparelhos de pesca, que são mundialmente reconhecidas como insuficientes para a efetiva gestão e garantia de sustentabilidade dos recursos pesqueiros. Dada a fragilidade histórica da gestão pesqueira, o país enfrenta hoje enormes lacunas em termos de monitoramento, avaliação de estoques e fiscalização da pesca, com um claro retrocesso nos últimos anos. A situação da pesca é bastante grave e precisa ser urgentemente revertida.
A produtividade biológica da pesca extrativa depende diretamente da capacidade de reposição natural dos estoques pesqueiros explorados. Por isso, é imprescindível manter um sistema eficiente e contínuo de coleta e análise de dados técnico-científicos e avaliações de estoque para subsidiar o adequado ordenamento da pesca. As informações essenciais, previstas no Sistema Nacional de Informações de Pesca e Aquicultura (SINPESQ), devem ser obtidas através de: (1) monitoramento de desembarques da pesca artesanal e industrial; (2) mapas de bordo; (3) observadores de bordo; (4) rastreamento via satélite de embarcações pesqueiras; (5) monitoramento da biodiversidade marinha independentemente da pesca comercial, por meio de cruzeiros de pesquisa e; (6) informações socioeconômicas. Apesar da sua importância, o SINPESQ foi criado por decreto presidencial em 1995 e nunca foi devidamente regulamentado e implantado. Essas informações são absolutamente fundamentais para estabelecer medidas de ordenamento e políticas de desenvolvimento adequadas à manutenção dos rendimentos da atividade econômica, dos benefícios sociais, da biodiversidade e da saúde dos oceanos no longo prazo.
É consenso absoluto entre os setores ligados à pesca que precisamos urgentemente qualificar a política pesqueira e estruturar o país para a implementação de um sistema de gestão pesqueira adequado. Nos últimos anos, diversas cartas, manifestos e moções sobre a necessidade de se produzir informações e melhorar a gestão pesqueira têm sido enviados à Casa Civil e aos Ministérios da Pesca e Meio Ambiente, mas infelizmente nenhuma dessas demandas recebeu qualquer resposta até o momento.
Impressiona o fato de que todos aqui subscritos – cientistas, organizações de proteção ao meio ambiente, lideranças da pesca industrial e da pesca artesanal – concordem e defendam a mesma posição: a pesca tem enorme importância e o Brasil precisa deuma política pesqueira qualificada, baseada em dados e diagnósticos confiáveis,que garanta a sua sustentabilidade em longo prazo.
Certos de que esta é uma demanda do conjunto da sociedade brasileira, através das organizações e especialistas abaixo assinados, vem respeitosamente, pedir à Vossa Excelência:
1)    A regulamentação e implantação imediata do SINPESQ, garantindo um monitoramento pesqueiro eficiente, que inclua a coleta sistemática e contínua de dados de desembarques, das capturas e do esforço de pesca, além da obtenção de informações biológicas, econômicas e sociais;
2)    Investimentos em pesquisa aplicada, em estreita parceria com os setores acadêmico e pesqueiro, para a avaliação periódica do estado dos estoques pesqueiros brasileiros;
3)    Adequação do marco legal nacional, com a definição de critérios, diretrizes e objetivos claros para o processo de gestão do uso dos recursos pesqueiros;
4)    Elaboração de planos de manejo para cada pescaria e planos de recuperação de estoques sobrepescados, com a participação de representantes da sociedade e da academia; sempre considerando a proteção da biodiversidade e a garantia dos benefícios socioeconômicos de longo prazo;
5)    Investimentos em fiscalização e combate à pesca ilegal.
            As organizações e especialistas abaixo assinados colocam-se à disposição para dialogar sobre essas propostas.
Organizações, por ordem de adesão:
1. Dra. Mônica Brick Peres, Diretora Geral da OCEANA Brasil, Vice-Presidente da OCEANA Internacional
2. Gabriel Calzavara de Araújo, Presidente da Atlântico Tuna
3. Tatiana Neves, Coordenadora Geral do Projeto Albatroz
4. Maria Ângela Marcovaldi, Coordenadora Nacional de Pesquisa e Conservação, Projeto Tamar/ Fundação Pró-Tamar
5. João Thadeu de Menezes, Presidente, e Marco Aurélio Bailon, Conselheiro da Associação Brasileira de Oceanografia – AOCEANO
6. Dr. Kleber Grübel da Silva, Diretor, MSc. Danielle da Silveira Monteiro, e Biólogo e Ecólogo Sérgio Curi Estima, Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental NEMA
7. José Ciaglia, Presidente do Sindicato dos Armadores de Pesca do Estado de SãoPaulo  SAPESP
8. Comte. Flavio de Moraes Leme, Presidente da Comissão Nacional da Pesca daConfederação da Agricultura e Pecuária do Brasil  CNA
9. Alexandre Guerra Espogeiro, Presidente do Sindicato dos Armadores de Pesca doEstado do Rio de Janeiro  SAPERJ
10. Dr. Sergio Schwarz da Rocha, Presidente da Sociedade Brasileira deCarcinologia – SBC
11. Carlos Alberto Pinto dos Santos, Secretário Executivo da Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas Costeiras e Marinhas – Confrem
12. Dr. Ricardo de Souza Rosa, Presidente da Sociedade Brasileira para o Estudo de Elasmobrânquios – SBEEL
13. Dr. Luis Tadeu Assad, Diretor Presidente, e André M. Brugger, Presidente do Conselho Deliberativo do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e Sustentabilidade – IABS
14. Georgia Pessoa, Diretora de Programa da Rare Brasil
15. Dr. Leopoldo Gerhardinger, Coletivo Memórias do Mar
16. Rodrigo Medeiros, Vice-Presidente do Programa Brasil, Conservação Internacional
Especialistas, por ordem de adesão:
1. Prof. Dr. Jorge Pablo Castello, Instituto de Oceanografia, Universidade Federal de Rio Grande – FURG
2. Prof. Dr. Fábio Hissa Vieira Hazin, Departamento de Pesca e Aquicultura, Universidades Federal Rural de Pernambuco – UFRPE
3. Prof. Dra. Carmen Lúcia Del Bianco Rossi-Wongtschowski, Instituto Oceanográfico, Universidade de São Paulo – USP
4. Prof. MSc. Roberto Wahrlich, Grupo de Estudos Pesqueiros, Centro de Ciências Tecnológicas da Terra e do Mar, Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI
5. Dr. Antônio Olinto Ávila da Silva, Centro APTA Pescado Marinho, Instituto de Pesca
6. Prof. Dra. Beatrice Padovani Ferreira, Departamento de Oceanografia, Universidade Federal de Pernambuco – UFRPE
7. MSc. Mauro Luis Ruffino, GSA Consultoria em Meio Ambiente Ltda.
8. Prof. Dr. Paul Gerhard Kinas, Instituto de Matemática Estatística e Física- Universidade Federal de Rio Grande – FURG
9. Prof. Dr. Otto Bismarck Fazzano Gadig, Laboratório de Pesquisa de Elasmobrânquios, Universidade Estadual de São Paulo – UNESP
10. Prof. Dr. Lauro Saint Pastous Madureira, Instituto de Oceanografia, Universidade Federal de Rio Grande – FURG
11. Prof. Dr. Marcelo Vianna, Departamento de Biologia Marinha, Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ.
12. Prof. Dr. Paulo Ricardo Pezzuto, Grupo de Estudos Pesqueiros, Centro de Ciências Tecnológicas da Terra e do Mar, Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI
13. Prof. Dra. Patrízia Raggi Abdallah, Unidade de Pesquisa em Economia Costeira e Marinha, Programa de Pós-Graduação em Economia do Mar, Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio Grande, FURG.
14. Prof. Dr. Paulo de Tarso Chaves, Universidade Federal do Paraná – UFPR
15. Prof. Dr. Agnaldo Silva Martins, Departamento de Oceanografia e Ecologia, Universidade Federal do Espírito Santo – UFES
16. Prof. Dr. Jose Angel Alvarez Perez, Centro de Ciências Tecnológicas da Terra e do Mar, Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI
17. Prof. Dr. Eduardo R. Secchi, Laboratório de Ecologia e Conservação da Megafauna Marinha – EcoMega, Instituto de Oceanografia, Universidade Federal do Rio Grande – FURG
18. Prof. Dra. Rosangela Paula Teixeira Lessa, Departamento de Pesca e Aquicultura, Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE.
19. Prof. Paulo A. S. Costa, Departamento de Ecologia e Recursos Marinhos, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO
20. Prof. Dr. Marcelo Antonio Amaro Pinheiro, Laboratório de Biologia de Crustáceos, Universidade Estadual de São Paulo – UNESP
21. Prof. Dr. Alexander Turra, Departamento de Oceanografia Biológica, Instituto Oceanográfico, Universidade de São Paulo – IO-USP
22. Prof. Dr. Eduardo Tavares Paes, Laboratório de Ecologia Marinha e Oceanografia Pesqueira da Amazônia, Universidade Federal Rural da Amazônia – UFRA
23. Prof. Fabio dos Santos Motta, Departamento de Ciências do Mar, Universidade Federal de São Paulo
24. Prof. Dra. Maria Lúcia Goes de Araújo, Departamento de Pesca e Aquicultura, Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE
25. Prof. Dr. Cláudio Luis Santos Sampaio, Universidade Federal de Alagoas
26. Prof. Dr. Rodrigo Leão de Moura, Instituto de Biologia, Departamento de Biologia Marinha, Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ
27. Luis Henrique de Lima, Oficial de Meio Ambiente do Setor de Ciências Naturais da UNESCO – Representação do Brasil
28. Aristides Pereira Lima Green, analista da Coordenação de Agropecuária, Diretoria de Pesquisas, Departamento de Agropecuária, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE

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