Era 29 de maio de 2012 quando Luís Abílio e a esposa Maria Luíza (82 e 86 anos à época, respectivamente) foram tirados à força de seu sítio de 10 hectares junto com os filhos e 18 netos. Os dois moravam há mais de 60 anos no Engenho Tiriri e lá tinham criado raízes, família, laços comunitários e sua base de sobrevivência. “Lugar de barriga cheia” é como eles se referiam ao local, pois o mangue e a terra tudo lhes davam.
Segundo a assessora jurídica do Fórum Suape, Mariana Vidal, a decisão judicial que embasou a retirada da família foi injusta. “Tecnicamente, os juízes não poderiam conceder a reintegração de posse a SUAPE, porque as ações possessórias são voltadas para proteger a posse. Aqueles que verdadeiramente detinham a posse das terras, uma posse inclusive anterior à criação da empresa, eram as famílias que faziam e fazem parte dessas comunidades tradicionais da área”, afirmou a advogada.
A filha do casal, Cleonice Maria da Silva, 38 anos, que havia dado à luz há apenas 14 dias quando foi violentamente arrancada do sítio, relembrou o dia mais triste da sua vida: “Eu nunca pensei que ia viver para ver uma imagem tão triste. Meus pais idosos sendo tratados por SUAPE como invasores. Eles, que cuidaram tanto dessas terras. Invasora é SUAPE. Derrubaram as nossas casas e jogaram o que era nosso na rua. Nós perdemos praticamente tudo”, desabafou Cleonice, que tinha mais quatro crianças pequenas na época.
Hoje, a família mora na periferia do Cabo, onde não há mangue nem terra para plantar e as condições de vida são extremamente precárias. “A situação só piorou, porque em Tiriri a gente tinha tudo. A gente pescava no mangue. Tinha manga, jaca, caju. Plantava macaxeira, feijão, verduras. Criava porco e galinha. Aqui, a gente passa fome”, lamentou Cleonice.
Em função do profundo desgosto causado pela realidade de miséria que lhe foi imposta, Seu Luís Abílio, pai de Cleonice, partiu no dia 20 de outubro de 2016, após um período em coma, fruto de um quadro de depressão profunda. A viúva Luíza, hoje com 98 anos, segue convivendo com a dor da perda do seu companheiro e do seu lugar de barriga de cheia.
SITUAÇÃO DA FAMÍLIA É PRECÁRIA
Atualmente, Cleonice junto com o seu esposo Luciano e os cinco filhos vivem numa situação extremamente delicada, pois a única fonte de renda atual do casal é o Bolsa Família e o pouco que Luciano ainda consegue tirar com a pesca no mangue, que, por sinal, vem sofrendo cada vez mais com os inúmeros impactos provenientes do desmatamento, das obras de dragagem e aterro e da poluição causada pelas indústrias.
Além disso, a família também contava com o auxílio-aluguel no valor de R$ 250,00 que SUAPE lhes pagava por força de sentença judicial. Esse auxílio, contudo, foi cortado pela empresa há cerca de oito meses, sem qualquer justificativa razoável, deixando a família em situação ainda mais precária, sem a menor possibilidade de conseguir quitar o aluguel da casa onde moram. “A gente está vivendo da ajuda do povo, porque nem sempre meu marido conse- gue pescar, pois vive doente”, afirmou Cleonice.
Luciano José Vicente dos Santos, 38 anos, já teve dois AVCs desde que foram arrancados do sítio e também enfrenta um quadro grave de depressão em decorrência das dificuldades que a sua família passou a viver longe do Engenho Tiriri.
SUAPE ESFOMEIA, ADOECE E MATA
Essa expulsão violenta e predatória vêm provocando inúmeros danos à saúde física e psicológica não só da família de Seu Abílio, Dona Luíza, Luciano e Cleonice, mas de todas as demais famílias que também passaram pelo processo injusto e doloroso da remoção forçada. Por trás da propaganda de desenvolvimento e de responsabilidade socioambiental ostentada pela empresa SUAPE, agonizam milhares de vidas que experimentam constantes privações e violações de direitos. É por Justiça que clama a família de seu Abílio e tantas outras, vítimas de verdadeiras barbaridades cometidas em nome de um falso desenvolvimento.
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