Está para ser votado pela ALEPE o Projeto de Lei n.º 2902/2021, de autoria do Governador Paulo Câmara, para autorizar a empresa SUAPE a doar uma vasta área equivalente a 323 campos de futebol para duas empresas da iniciativa privada.As terras a serem doadas, segundo o memorial descritivo que consta no Projeto, estão localizadas no Engenho Jurissaca, em Ponte dos Carvalhos, no município do Cabo de Santo Agostinho.
Essas terras fazem parte do território de 13.500 hectares apropriado pela empresa pública e historicamente habitado por comunidades agricultoras e pescadoras artesanais, como é o caso da comunidade de Jurissaca, formada por agricultores que se encontram na área há mais de 30 anos.
Com o advento do novo Plano Diretor de Suape (Decreto 37.160/2011), a área do Engenho Jurissaca foi integralmente designada como Zona Industrial, e a ocupação humana dentro de seu perímetro foi proibida, sem que tenha havido, no entanto, qualquer consulta prévia às comunidades que ali residiam e trabalhavam há décadas.
No ano de 2011, com as tratativas para a instalação de uma siderúrgica na área, SUAPE deu início à remoção forçada da comunidade. Uma parte das famílias recebeu uma pequena indenização e foi realocada para um assentamento rural localizado no município de Barreiros.
No meio desse processo de remoção, no entanto, houve o cancelamento da vinda da siderúrgica e a consequente interrupção das remoções e pagamento das indenizações. Desse modo, 41 famílias acabaram remanescendo no Engenho.
Essas 41 famílias passaram a ser assediadas e impedidas de continuarem a plantar e a morar em paz nos seus sítios. As famílias relatam inúmeros casos de violências praticadas por funcionários da empresa, como ameaças, destruição de lavouras, de cercas e de casas. A permanência delas na área também tem sido dificultada pela interrupção do fornecimento de energia, sob ordens de SUAPE. A situação de precariedade extrema chegou a fazer com que algumas famílias se vissem obrigadas a deixarem seus sítios.
Várias foram as vezes em que a situação da comunidade foi tratada com SUAPE, numa tentativa de cobrar o pagamento das indenizações e o reassentamento adequado para as famílias viverem com dignidade em outro local. Em 2016, Evandro Avelar, então presidente da empresa, chegou a se comprometer, em reunião com diversas lideranças comunitárias, a proceder com as indenizações e reassentamentos. No entanto, a gestão seguinte da empresa não levou o compromisso adiante.
Apesar de reconhecer o débito para com esses agricultores desde 2011, SUAPE, em momentos posteriores, afirmou não ter condições financeiras para arcar com o pagamento das indenizações.
Ao mesmo tempo em que alega a falta de recursos, no entanto, a empresa pública, desde 2016, vem repassando suas terras praticamente a título gratuito para a iniciativa privada.
Por meio da Lei n.º 15.932 de 30 de novembro de 2016, atendendo a requerimento do Governador, o Legislativo autorizou SUAPE a vender suas terras com desconto de até 70% durante dois anos. Em 07 de junho de 2019, por meio da Lei n.º 16.582, o Legislativo voltou a acatar requerimento do Governo para prorrogar a aplicação do desconto por mais 4 anos.
Não bastante, recentemente Paulo Câmara requereu, por meio do Projeto de Lei n.º 2921/2021, a DOAÇÃO de uma área de 323 hectares para duas empresas privadas.
É de se questionar, com base no princípio da moralidade da Administração Pública, a postura contraditória do Governo do Estado e de SUAPE de, por um lado, negligenciar a situação das famílias de Jurissaca, sob a justificativa de não ter orçamento para indenizá-las e reassentá-las, e, de outro lado, repassar terras públicas a empresas privadas a valores irrisórios e, agora, a título gratuito. Trata-se de uma verdadeira dilapidação do patrimônio público e descaso com as 41 famílias que desde 2011 reivindicam os seus direitos usurpados pela empresa.
Diante de tudo isso, o Fórum Suape Espaço Socioambiental e as famílias do Engenho Jurissaca rogam pela não aprovação do Projeto de Lei n.º 2902/2021!
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