Imagem cedida pelo Núcleo de Comunicação Caranguejo Uçá
A data de 20 de outubro de 2020 era de muita expectativa, pois SUAPE assinaria um acordo com o MPF, o MPPE, a DPU e com a Associação Quilombola Ilha de Mercês, no qual se comprometeria a iniciar o desbloqueio do Rio Tatuoca até junho de 2021. Entretanto, após meses de reuniões e tratativas, no momento da assinatura do Termo de Ajustamento de Conduta, por meio do qual se selaria o compromisso, SUAPE, para a surpresa de todos e sem maiores explicações, negou-se a assinar e se retirou da reunião.
O objeto do Termo de Ajustamento de Conduta era um cronograma apresentado pela própria SUAPE em que a empresa se comprometeria a seguir os passos necessários para que, ao final, parte do barramento que estrangula o Rio Tatuoca há mais de 12 (doze) anos fosse retirado. O bloqueio foi realizado no ano de 2007 com o propósito de se construir um acesso provisório ao Estaleiro Atlântico Sul. No entanto, o acesso que estava previsto e autorizado para permanecer por apenas cerca de 1 ano e 6 meses acabou sendo mantido até hoje sem qualquer licenciamento.
Estes mais de 12 (doze) anos em que o barramento tem permanecido ilegalmente sobre o Rio Tatuoca tem trazido vastos prejuízos tanto ao ecossistema da área quanto à população de seu entorno. O Tatuoca é um rio de importância fundamental para a Comunidade Quilombola de Ilha de Mercês, importância esta não apenas para sobrevivência material dos moradores dessa região, que dele dependem para retirar o seu sustento através da pesca artesanal, mas também para a perpetuação da identidade coletiva da comunidade.
Com o barramento, que cortou a ligação natural entre o Rio Tatuoca e o mar, a vazão natural da maré restou impedida, na cheia e na vazante, de forma que vem ocorrendo, há anos, a morte de árvores de mangue e de inúmeras espécies de peixes, moluscos e crustáceos que dependem do fluxo e refluxo natural da maré para sobreviver. A própria CPRH, em Nota Técnica emitida no ano de 2007, quando da construção do barramento, constatou os graves danos ao mangue decorrentes da obra. Ainda assim, o bloqueio foi mantido durante mais de uma década, afetando, ademais, a pesca artesanal, de que dependem os moradores de Ilha de Mercês para manter o seu sustento.
Diante deste cenário de total desrespeito ao meio ambiente, em 2008, o Ministério Público Federal instaurou o Inquérito Civil nº. 1.26.000.001531/2008-13, com o objetivo de “apurar notícias de graves danos ambientais e prejuízos à população nativa” da área. Após, a Defensoria Pública da União e o Ministério Público de Pernambuco juntaram-se ao MPF na atuação neste procedimento. A Assinatura deste TAC, portanto, seria o início da solução dos problemas abordados neste Inquérito Civil.
Apesar de ostentar uma imagem de empresa social e ambientalmente responsável perante a opinião pública, as práticas de SUAPE destoam bastante de seu discurso. A postura de SUAPE reflete o descompromisso histórico da empresa em relação às comunidades prejudicadas por suas ações e mostra que o desrespeito atinge também as instituições do sistema de justiça. O lamentável episódio ocorrido no dia 20 de outubro reforça a necessidade de se continuar denunciando a empresa pública e exigindo dos órgãos do Estado as medidas cabíveis para a promoção da justiça socioambiental no território atingido.